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Educação Básica Pública Salvador/Bahia: racismo, racistas e nuances do que venha ser consciência negra "…."



DOMINGOS OLIVEIRA DE SOUSA

A princípio, a impressão dada é de que a escola de educação básica pública já superou práticas de racismo e a ideia de consciência negra é um fato social combatido no espaço escolar na cidade de Salvador/Bahia, que tem um contingente populacional de cor de pele negra fora do continente africano, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2017, 82,1% se autodeclararam como negros (pardos- pretos). Isto é, por ser maioria, tudo se encontra resolvido.

Este é um começo. Então, problematiza-se: se parte significativa da população de Salvador/Bahia é afrodescendente, então esta sociedade já superou o racismo, a segregação racial e afins?

O primeiro desafio é compreender que o espaço da educação básica da escola pública como um ambiente racista. Não se trata tão somente do racismo biológico que se deu início no século XV. Eis o segundo fato social. O racismo e os racistas estão a postos, sobretudo, no ambiente escolar da escola pública. A constituição do analfabeto funcional, que a educação básica (re)produz ano após ano é uma das nuances do racismo institucional diário da escola pública.

As tipologias de racismo criadas do Wieviroka em “Racismo Uma Introdução”. Faz nos perceber a próprias e as facetas do racismo e dos racistas. Este cita, ao menos, três tipos: o biológico, o cultural, institucional. Incluo a subjetividade do racismo como forma continua de dizer-se contra ao racismo, e ao mesmo tempo, sob diversas formas, praticar o mesmo.

A escola pública por muito tempo teve a capacidade de impactar na vida dos estudantes, ou seja, transformar o escolar em sujeito formal como conceitua J. Piaget. Muito da elite pensante da cidade Salvador passou pelo Colégio da Bahia, exemplo de escola pública de sucesso na formação de seus escolares. O que ocorreu de ontem para hoje?

A impressão dada é que não se tratava apenas do investimento que era feito na educação. Isto é importante. É fato que o estudante afrodescendente chegava em condição desigual, contudo a escola pública tinha a capacidade de transformar o sujeito concreto em sujeito formal. É preciso ficar atento ao conceito de Modernidade Tardia de A. Giddens para compreender a importância das cotas raciais, entre outras ações afirmativas que tenha a intenção de incluir os estudantes afrodescendentes, entretanto trata-se de circunstancias tardias.

Quando o afrodescendente chega a ocupar este espaço. Este já tem outro sentido em seu existir. É como se fosse uma moeda que orbitasse no universo do dólar e a cada momento por vir a ter um valor diferente, mas dificilmente igual ou superior ao dólar. Este é uma das características das moedas dos países sul-americanos, africanas e afins. Enfim, chegar atrasado, significa também participar do final da festa, “sem pompa e com a roupa rota do dia a dia”.

Ao tempo em que a classe média foi saindo da escola pública, a população pobre foi dando os primeiros passas na formação escolar. A educação pública foi depauperando. Perdeu o sentido inicial e foi ganhando outros sentidos e contornos. Quando me refiro aos pobres, é bom informar que a maioria são de pobres afrodescendentes em contexto tardio de formação escolar, por um lado. Por outro lado, percebe-se que o que se chamou de Aparelho Ideológico por L. Althusser passou a ser Aparelho Repressivo. Paulo Freire também informa o mesmo comportamento na Pedagogia do Oprimido, ou seja, estrutura maior o Estado: os tecnocratas responsáveis pela educação e as políticas dos diversos grupos sociais e seus respectivos governadores oprimem as bases educação, ou seja, os professores, que a cada momento foi transformando de sujeito formal para sujeito concreto, quando não, operário da educação.

O professor é um sujeito em contínua luta, a fim de reaver sua condição de trabalhador em/na educação e que esta seja respeitada, entretanto o seu filho foi e vai para escola particular… e… seu aluno no decorrer dos anos deixou de aprender os conteúdos significativos, a fim de que este galgue os melhores postos de trabalhos, bem como a sua inserção na universidade pública. Ou seja, toda a estrutura do estado é responsável pela falência da educação pública; bem como a displicência com as diversas práticas de racismo e de racistas no ambiente escolar público.

O estudante tem a percepção e a sensibilidade que é discriminado no ambiente escolar a todo ou a qualquer momento. A ideia de consciência negra de Florestan Fernandes em: “O negro no mundo dos brancos”. Acredito que vá além… Há uma Estética do Batuque. Isto é, uma forma de ser e estar que ao mesmo tempo é a rebeldia da senzala, é o canto e a dança para os orixás, inquices, voduns, caboclos, que se transformam em músicas formas de ser, estar e agir nos contextos contemporâneos de jovens de bairros periféricos de Salvador/Bahia.

Há uma resistência, violência, brutalidade e brutalização dos adolescentes que se encontram nas fronteiras entre o legal e/ou ilegal. Este é a Estética do Batuque que tem sido desenhada na vida dos jovens afrodescendentes de bairros da periferia de Salvador. Isto é, a cultura local do seja do ponto vista ethos e o do eidos.

Esta estética poderia vir a ser transformadora no espaço escolar; contudo basta que os pares do espaço escolar: gestão, funcionários e professores escolares sejam preparados para tal realidade; mesmo porque muitos destas personagens; são oriundos de bairros periféricos e da pobreza; ou trabalham com tal realidade. Cabe a estes professores e professaras rever os seus discursos racistas e de marginalização dos afrodescendentes; a fim de que o espaço escolar faça, execute a sua função social de incluir através de um currículo transformador frente a realidade cultural dos escolares.

Algumas conclusões

A primeira diz respeito a Stuart Hall em um dos seus artigos questiona no livro “Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturas: “Que negro é este? ”. Eu diria que afrodescendente é este? Não desejo concluir deixando as realidades em um só lugar, mas, ao contrário, deixá-las em aberto para maiores reflexões. É perceptível: uma dificuldade no ambiente escolar em assumir-se racista e cuidar de tal como uma patologia social que acometem aos professores, gestão e funcionários e escolares no espaço escolar, bem como no contexto familiar e, por fim, na comunidade onde vive.

Segundo, seja do ponto de vista intencional ou acidental o ambiente escolar de forma geral, debocha, brinca com as relações raciais: histórias, línguas e culturas das populações de negro africano trazido para o Brasil na condição de escravizado. Este genocídio não é respeitado. Fazer uma festa é desrespeito frente a morte de milhões de pessoas no Oceano Atlântico e nas Américas. A semana nas suas semanas da consciência negra não é isso. Percebe-se que se fala uma coisa e o que se fizesse outra. É preciso planejar o ano inteiro. Não se pode planejar somente por uma semana em uma atividade incidental.

Terceiro, a impressão dada é que há uma longa caminhada a fim de que as relações raciais no contexto brasileiro provoquem alguma moralidade nos sujeitos implicados na atualidade, isto é, os afrodescendentes em suas realidades no campo e na cidade; e o branco brasileiro; a fim de as reparações aconteçam no sentido de reparar as diferenças históricas entre afrodescendentes de branco no espaço brasileiro.

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